Covid-19 e Vacinas – Pausas, Segurança e Desinformação

 

O Canadá acabou de pausar a primeira dose da vacina AstraZeneca para seus residentes, depois de constatar casos de tromboses e uma morte entre os que tomaram a vacina. Antes disto, o país tinha decidido que a vacina só seria aplicada para pessoas acima de 55 anos, considerando que os casos registrados foram de pessoas mais jovens, principalmente do sexo feminino. Alguns casos de tromboses ou coágulos, que resultaram em acidente vascular cerebral, ataques cardíacos ou perda de sangue em partes do corpo, foram registrados na Europa e no Reino Unido, maior usuário da vacina. 

Muitos líderes mundiais tomaram a vacina da AstraZeneca, incluindo os Primeiros-ministros do Canadá e Reino Unido. No Brasil, segundo a Anvisa, até bem pouco tempo não se tinha registrado nenhum caso. A informação de que o Brasil recebeu lotes diferentes da vacina não é convincente, até porque a comunidade científica já constatou que a vacina pode causar casos raros de trombose venosa profunda (TVP) ou trombocitopenia, em qualquer faixa etária, sexo, lote ou país em particular. Ao se tratar de salvar vidas, as vacinas devem ser compreendidas dentro de princípios de qualidade, segurança e eficácia, com o máximo de transparência e informações, que devem ser digeridas pelos que vão recebê-las. As pessoas sempre querem saber sobre a segurança das vacinas e as informações devem ser as mais transparentes possíveis. Quando se tem mais de uma vacina, as decisões podem se tornar mais fáceis.

Um dos temas mais estudados em economia da saúde diz respeito a custos e benefícios. Coisas ruins acontecem com as pessoas todos os dias em relação à saúde, em termos de ataques cardíacos, câncer e outras doenças crônicas. Além disto, temos acidentes automobilísticos e outras violências do dia a dia. Quem se vacina pode ter também problemas, mas por acaso. Por outro lado, estamos vendo os riscos em não se vacinar nesta pandemia. Assim sendo, tudo gira em termos de riscos e benefícios e temos que observar estes casos de tromboses e compará-los com os benefícios da vacina. Por exemplo, a vacina da gripe causa a síndrome de Guillan-Barre, de uma a três pessoas, por milhão de vacinados, sendo uma condição neurológica séria. Mesmo assim, os benefícios da vacina da gripe estão acima destes riscos, quando comparado com as mortes.

No caso da Covid-19, o que aconteceu na Inglaterra, grande usuária da AstraZeneca? O país alcançou um elevado índice de vacinação e em breve será um dos primeiros a voltar ao normal, uma vez que já se tem dias sem registro de mortes. Mesmo no Canada, a AstraZeneca foi uma boa opção e ajudou a mudar a trajetória da epidemia em muitas regiões e permanece como uma excelente vacina para prevenir hospitalizações, reduzir mortalidade e a chance de transmitir o vírus para outros. Se o índice de casos de tromboses for de um caso para cada milhão de pessoas vacinadas, o Reino Unido vai registrar em torno de 70 pessoas atingidas e um número bastante reduzido de mortes entre estas, numa população de 70 milhões de habitantes e mais de150 mil mortes pela Covid-19.

O cálculo tem sentido no nível individual e os benefícios devem ser observados. Cada país apresenta situações diferentes e o fato de uma pausa da vacina da AstraZeneca no Canadá não significa que o Brasil deva fazer o mesmo. O Canada hoje, com 40% da população vacinada e um lockdown rígido que está levando o país a controlar o vírus e com as opções das vacinas da Pfizer e Moderna, fornecidas em abundância no momento, pode se dar ao luxo de optar por estas duas últimas. Por conta disto, especialistas em doenças infecciosas, baseados nos cálculos de riscos dizem que não há mais desculpas para se usar a AstraZeneca no Canadá. A Noruega, por exemplo, já sugeriu que se fique livre do medo de tromboses tanto das vacinas da AstraZeneca como da Johnson & Johnson, que apresenta os mesmos problemas. No caso do Brasil, no auge da pandemia, com duas a três mil mortes por dia, a opção é seguir a Inglaterra e outros países e usar a AstraZeneca como uma opção para enfrentar o vírus e reduzir esta mortalidade exagerada.

Espera-se que não se continue criando entraves para a importação das substâncias vacinais e o Brasil faça uso acelerado das vacinas Coronavac e AstraZeneca para controlar o vírus. Outras vacinas como a Pfizer, Moderna e Johnson & Johnson vão fortalecer o programa de vacinação do país. O menosprezo por vacinas pelo governo chegou a um nível tão deprimente, que uma CPI foi instalada para se averiguar o caso. Isto sem falar no menosprezo pela falta de transparência quanto à segurança das vacinas e a desinformação inaceitável de que elas podem levar as pessoas a se transformarem em jacarés.

Outra vacina ainda em análise pela Anvisa é a Sputnik V e que pode ser somada às demais já aprovadas. Trata-se de uma vacina criticada pela falta de transparência, mas comentários recentes da revista científica Lancet apresentaram resultados claros e o princípio científico de vacinação demonstrado é que se trata de outra vacina que pode se juntar a batalha de reduzir a incidência do Covid-19. Neste cenário, tem sido dito que a melhor vacina é a que está disponível e regulamentada e pode ser levada ao seu braço.


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