Voto Eletrônico Coloca Justiça Eleitoral de Joelhos – De Juízes a Generais
No momento atual, a indicação de um General
para a diretoria-geral da Corte eleitoral dá uma impressão de insegurança do TSE sobre o voto eletrônico. O
grande erro da justiça eleitoral foi judicializar a tecnologia do voto
eletrônico, com a permissão dos partidos políticos. Agora parece que se quer
militarizá-la. Isto é preocupante e um péssimo exemplo para o mundo. É inadmissível uma Justiça Eleitoral de Joelhos.
O voto eletrônico foi introduzido no Brasil,
quando havia uma crítica mundial sobre a segurança desta tecnologia. A
Inglaterra fez várias tentativas de introduzi-la, mas desistiu depois de
perceber que o voto eletrônico não tinha a confiança da sociedade. A Holanda,
depois de duas eleições com o voto eletrônico, desistiu por completo da
tecnologia, no momento em que urnas eletrônicas foram testadas por
especialistas da área, comprovando a fragilidade delas.
Contudo, o Brasil foi a frente com seu projeto
de voto eletrônico. A questão de confiança, um dos tópicos bastante estudados
nas áreas de economia, estratégias, sociologia, comportamento organizacional,
filosofia, ética e tecnologia da informação, foi negligenciada. Há mais de dez
anos publicamos texto no JeDEM (Jornal e-democracy), mostrando como
instituições e tecnologia estão emaranhadas numa estrutura de interesses no
setor público de tal forma que se tentou fabricar e criar suavemente uma confiança do voto eletrônico no Brasil.
Infelizmente, nunca houve interesse da elite
política em discutir o voto eletrônico no Brasil, incluindo a imprensa
dominante. Através de um forte marketing do TSE, buscou-se a
institucionalização de confiança no voto eletrônico, com vozes oficiais
apoiando-o. Tornou-se difícil questionar esta tecnologia e sua segurança, uma
vez que qualquer crítica era sempre desqualificada. Contudo, se as pessoas estiverem preocupadas
com a cidadania, o momento é oportuno para se discutir se está tecnologia está
ou não empoderando os cidadãos brasileiros, considerando ser uma tecnologia de
elevadíssimo custo.
Esta situação nos força a pensar nisto e no
futuro de nossa democracia. Sempre vamos precisar de ajuda da tecnologia, mas
não vamos deixar que o mercado funcione e expresse nossa vontade política
passivamente com relação ao discurso de confiança, que pode ser fabricado por
trás de portas fechadas, baseada em
lucros e interesses.
Havia resistências políticas ao voto eletrônico
no país, além de resistência de muitos especialistas da área, razão pela qual
deveria ter havido uma grande participação da sociedade na discussão de sua
implementação, não só mostrando as tecnicalidades da tecnologia, mas as
questões sociais e políticas, de tal forma que se tivesse uma tecnologia
desenhada que viesse refletir nosso melhor entendimento de liberdade, justiça
social e as fontes de desigualdades e injustiças.
Tem sido dito que enquanto a tecnologia de
informação tem o potencial de melhorar o processo democrático, expandir a
cidadania e empoderar as pessoas, ela tem também a capacidade de perpetuar e
reforçar as desigualdades econômicas e sociais, levando a piorar o nível de
pobreza. No Brasil, o voto eletrônico não contribuiu para ampliar o
empoderamento dos membros da sociedade. Por acaso, o voto eletrônico melhorou
nossa democracia, ampliou a participação e cidadania, acabou com a compra de
votos e corrupção, ampliou a confiança nas eleições e reduziu as abstenções?
Vários fatos nos levam a nos preocupar com os
riscos de nossa democracia, começando com o pequeno número de mulheres nos
representando no Congresso Nacional; nossos representantes se tornando cada vez
mais ricos, com alguns deles mais ricos depois de cada eleição; compra de
votos; elevadas abstenções nas eleições e corrupção no Congresso. Soma-se a
isto as denúncias do Presidente da República alegando fraudes nas eleições
resultantes das urnas eletrônicas. Parece ser uma denúncia oportunista,
considerando que o Presidente foi parlamentar durante décadas e nunca
questionou as urnas eletrônicas.
O que mais estranha é o silencio do Congresso
Nacional em relação a esta denúncia de fraudes das urnas, com riscos à democracia e segurança nacional. Há poucos
meses, diante das denúncias infundadas de Trump sobre as urnas eletrônicas, nos
Estados Unidos, o Congresso americano aprovou uma série de medidas para
torná-las seguras. Por outro lado, aprovou recursos para que a Comissão
Eleitoral do país atue nesta direção. Vale mencionar ainda o recente relatório
do Centro para Democracia e Tecnologia que discute a segurança e proteção do
processo eleitoral como ponto crítico da democracia.
Para este Centro, diante das ameaças às urnas
eletrônicas é preciso não só reforçar a segurança delas, mas construir a
confiança pública, como fundação importante para o funcionamento da democracia.
Com certeza, teorias de conspiração e desinformação sobre a integridade das
eleições e fraudes vão circular, mesmo na ausência de qualquer evidência
concreta.
O padrão ouro de segurança do voto ainda é o
voto tradicional de papel em que o eleitor escolhe seu candidato, usando apenas
uma caneta, sem a intermediação de bugigangas eletrônicas. Não só deixa a marca
de sua intenção de votar, como habilita qualquer processo de auditoria. Num
passado recente, para se esconder ou roubar o voto do eleitor era preciso
roubar a urna. Sair deste processo para o voto eletrônico implica em manter a
segurança e muita confiança da sociedade, num momento em que ainda se discute
as vulnerabilidades desta tecnologia.
Assim sendo, não é só com juízes ou generais
que iremos reforçar a segurança e confiança no voto eletrônico. É equivocada a
visão determinista da tecnologia, que deve ser socialmente construída, com
ampla participação da sociedade. Estes fatos parecem mostrar a necessidade de
uma profunda mudança da administração das eleições no Brasil, ampliando a
participação da sociedade.
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