Votar é um direito ou dever?
A questão
de votar como um direito ou um dever vem ganhando a atenção de
cientistas políticos, dos próprios políticos e filósofos nestes
tempos de crise do sistema democrático, principalmente em países
desenvolvidos. Neste caso, enquanto alguns defendem que votar é um
direito outros defendem que é um dever. O que se observa, contudo, é
que existe, por parte de alguns, a defesa de se aumentar o número
de eleitores durante as eleições para se registrar a idéia da
grande participação popular no processo democrático. Acontece que
a democracia nao deve ser vista apenas durante as eleições, mas
depois delas. Democracia não é a ampla participação durante as
eleições, mas a ampla participação depois das eleições.
Recentemente
o sindicato da união dos trabalhadores, no Reino Unido, foi
contrário ao voto obrigatário, num país onde votar é um direito
e nao um dever - compulsório. Para aquele sindicato, a única forma
de se melhorar e manter a legitimidade da democracia é através do
amplo engajamento voluntário no processo político, através de uma
ampla educação política da sociedade. Portanto, a melhoria da
democracia e de nossa cidadania depende de um amplo engajamento da
sociedade nas decisões políticas, sobretudo depois das eleições.
Na
maioria dos países votar ou não votar é um direito adquirido pelo
cidadão. Neste caso, não votar não implica em punições severas
ou sanções para o eleitor, como acontece no Brasil, onde o voto é
obrigatório. O voto obrigatório existe em poucos países, mas o
Brasil parece ser o único que adota punições severas para os que
não justificam o ato de não votar.
Não
vamos aqui entrar na discussão de votar como um direito ou dever,
mas tentar mostrar que as punições sofridas pelos eleitores que não
justificam o ato de não votar merece uma ampla discussão da
sociedade. Em que pese todos os argumentos favoráveis ao voto
obrigatório, no Brasil são consistentes os argumentos para que o
ato de votar seja um direito e não um dever. A compra de votos no
Brasil, por exemplo, depõe contra o voto obrigatório. Aliás,
historicamente, a defesa do ato de votar como um dever sempre foi
defendido pela direita e não pela esquerda.
Mesmo que
votar seja sempre visto no Brasil como um dever, algumas concessões
precisam ser feitas considerando principalmente a burocratização do
ato de não votar, ou seja, o voto obrigatório no Brasil deu origem
a um processo de burocratização que serve apenas para reforçar o
poder da Justiça Eleitoral, em detrimento da perda de alguns
direitos humanos. A decisão de não votar é um direito na maioria
dos países, mas no Brasil tende a tolher o direito de ir e vir e
reduzir a cidadania.
Nos
últimos dias, os meios de comunicação do país, incluindo a
televisão, informavam que quem não justificasse sua ausencia nas
eleições passadas não poderia tirar passaporte, carteira de
identidade, renovar matricula em estabelecimento de ensino oficial e
obter empréstimo em instituições financeiras governamentais. Em
alguns países, onde o voto é obrigatório, exige-se apenas o
pagamento de uma multa dos eleitores que não justificam suas
ausencias durante as eleições. Por que no Brasil temos que ser
submetidos a tantas punições? Será que no momento o voto é tão
importante assim?
Por outro
lado, não existe nenhuma punição para o voto de protesto. E o voto
em branco ou nulo? E a compra e venda de votos? A soma dos
percentuais de abstenções, votos em branco, nulos e de protesto,
talvez seja maior do que o percentual dos que votam conscientemente.
Por que é aceito o voto de protesto e não se aceita candidaturas
avulsas? Isto, por si só, merece uma discussão da deterioração da
nossa democracia, do ato de votar como direito ou dever e das severas
punições a que são submetidos os eleitores brasileiros.
A cada
dia que passa o cidadão brasileiro sofre com a perda de seus
direitos e cidadania. Não tem mais sequer o direito de fiscalizar o
seu voto durante as eleições, já que tudo é privatizado e
terceirizado, através de urnas eletrônicas. O que se observa é um
repasse de poder do eleitor para as instituições que controlam as
eleições. Por conta disto, é necessária uma mudança
organizacional do modelo de administração das eleições no Brasil,
a cargo da Justiça Eleitoral. Ora, as eleições interessam ao Poder
Executivo, Legislativo e, principalmente, aos eleitores. Neste caso,
o poder de administrá-las deve recair sobre as partes interessadas,
a menos que houvesse um poder superior ou santo.
A
fragilidade de nossa democracia no momento torna público a falta de
independência dos três poderes da nação, com cada um deles
querendo poder mais. Desde a eleição do Presidente Fernando
Henrique Cardoso que se criou, neste país, uma espécie de poder
executivo imperial, anulando a existência do poder legislativo, que
não parece mais representar o povo. A arrogancia totalitária do
poder executivo tem resultado no que estamos assistindo hoje. O povo
não tem poder de nada. Dele quererm apenas o voto, para legitimar a
arrogancia totalitária existente no país. Se o poder emana do povo
e em nome dele deve ser exercido, temos que repensar o ato de votar,
as punições do ato de não votar, a administração das eleições
neste país e o resgate do poder do povo.
Texto divulgado pelos sites Congresso em Foco e Ecodebate, conforme abaixo:http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/outros-destaques/votar-e-um-direito-ou-dever/
http://www.ecodebate.com.br/2013/05/20/votar-e-um-direito-ou-dever-artigo-de-jose-rodrigues-filho/
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