Divulgação de salários dos servidores públicos – Transparência e Privacidade
O negócio público deve ser conduzido em
público, mesmo causando desconforto e embaraços para alguns.
A utilização das tecnologias de informação e comunicação
(TICs) vem, de um lado, facilitando a transparência, sobretudo no setor
público, mas, por outro lado, tem-se registrado a invasão da privacidade. Este conflito abre um importante espaço para
o debate, especialmente nas áreas do direito e da ética para elucidar o
principio da transparência e o significado da invasão de privacidade. É importante delimitar estes espaços, de modo
que a sociedade compreenda os avanços da democracia.
Nas eleições presidenciais passadas vários exemplos de
invasão de privacidade vieram à tona, quando sugiram comentários sobre a
construção de um dossiê com dados pessoais de familiares de um dos candidatos a
presidente da Republica e o fato de que funcionários da receita federal estavam
tendo acesso às informações pessoais dos contribuintes brasileiros. Neste caso,
o próprio governo, a exemplo das ditaduras totalitárias, utilizou as TICs para
invadir a privacidade de cidadãos brasileiros. Em recente texto sobre as TICs e
direitos humanos no Brasil, publicado pela Revista Internacional de Tecnologias
de Informação e Desenvolvimento Humano,
tratamos dos riscos e efeitos maléficos de uma ditadura invisível de
investigação eletrônica (http://www.igi-global.com/article/ict-human-rights-brazil/65756).
Esta decisão da nossa Corte de Justiça está em
sintonia com o que vem acontecendo nas democracias mais avançadas, ao recorrer
a nossa constituição e demonstrar que “A remuneração dos agentes públicos
constitui informação de interesse coletivo ou geral". A decisão do
Ministro Carlos Ayres Brito não se diferencia de decisão tomada, há poucos anos,
pela Suprema Corte de Justiça da California, quando determinou que a informação
sobre o salário do servidor público constitui um registro público, ou seja, é
uma informação pública. Para aquela Suprema Corte, a expectativa individual de
privacidade de salários ganhos na administração pública é significantemente
menor do que a expectativa de privacidade em relação a salários ganhos no setor
privado.
A divulgação de salários dos servidores públicos deve
ser feita no sentido de enfatizar estas desigualdades, considerando ainda inúmeros
exemplos de nepotismo, favoritismo, corrupção e a má gestão financeira na
administração pública. É lamentável, por exemplo, que um professor com formação
acadêmica, em nível de doutorado, receba menos do que muitos servidores
públicos apenas com curso de graduação. A exemplo de outros países, a
divulgação de salários dos servidores públicos só tem sentido se for enfatizado
aqueles que ganham acima do normal. Se existe um teto máximo, na forma da lei,
como justificar o salário daqueles que estão ganhando acima deste teto? Se a
lei permite acumulação de salários e aposentadorias e o montante excede o valor
do teto máximo, que isto seja bem explicitado para a sociedade, até para se
evitar julgamentos indevidos.
Não se sabe até quando a sociedade vai poder conter a
sua indignação diante dos altos salários pagos a alguns servidores públicos, já
considerados pela imprensa nacional e internacional como sendo um roubo ao
contribuinte e parte de um crime organizado de raízes profundas, que se tornou
invisível durante anos, por conta da falta de transparência pública.
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