Dos Alimentos Que Matam Para Os Que Curam – Segurança Alimentar
Fonte: Cardio DF
Tanto os alimentos que matam quanto os que curam têm sido enfatizados na literatura, mas o controle de qualidade de alimentos ainda é muito limitado, o que dificulta nossa segurança alimentar. Neste texto, a segurança alimentar é enfatizada, mas sabemos da relevancia das questões nutricionais, devendo os dois temas serem tratados conjuntamente.
Há pouco tempo, artigo no New York Times, intitulado
“Nosso Alimento está Matando Muitos de Nós” (Our Food Is Killing Too Many of Us), os autores trataram os alimentos do ponto de vista nutricional, alegando
que uma dieta pobre é a principal causa de mortalidade nos Estados Unidos,
causando mais de meio milhão de mortes por ano.
Foi estimado que 10 fatores
dietéticos causam cerca de mil mortes diariamente, só de doenças do coração e
diabéticos. Os custos com estas duas doenças são elevadíssimas em todo o mundo.
Para os autores do trabalho, o custo econômico total da obesidade é estimado em
US$ 1.72 trilhões por ano, ou 9.3 do Produto Interno Bruto.
O controle de qualidade
de alimentos está mais voltado para a segurança alimentar, que no Brasil ainda
é pobre, mesmo quando existe algum controle. Há cerca de 25 anos atrás,
elaboramos um trabalho intitulado “Controle e Qualidade de Alimentos em Saúde
Pública”, o qual parece atual, tendo sido citado recentemente em duas
dissertações de mestrados, conforme citações abaixo.
O conceito de qualidade de alimentos é
complexo. No mercado significa um apelo de vendas ou de economia para o
consumidor. Para as revistas de nutrição o conceito de qualidade de alimentos
significa um apelo à boa saúde e para os toxicologistas qualidade quer dizer
segurança, já que os alimentos devem ser inofensivos.
Assim sendo, a segurança
de alimentos tem sido definida como sendo uma prova razoável de certeza de que
os alimentos são sanitariamente adequados, reconhecendo-se a relação que existe
entre qualidade de produto e qualidade de vida das pessoas. Mesmo sendo
complexa a medida de qualidade de alimentos, não se pode desprezar o controle
de qualidade e a relação que os alimentos têm com a saúde das pessoas. Portanto,
o produto alimentício que põe em risco a saúde não tem qualidade.
Numa das dissertações de mestrado, acima
citadas, a pesquisadora Tarciara Magley da Fonseca Pereira, da Universidade
Federal Rural do Semiárido, Rio Grande do Norte, analisou a relação entre as
boas práticas de fabricação e a qualidade do queijo de coalho produzido no
município de São Rafael – RN.
Os resultados de seu trabalho mostraram que as
queijarias de São Rafael não faziam uso de boas práticas de fabricação,
tornando os produtos impróprios para o consumo, diante da contaminação de
bactérias e vírus mortíferos como o Staphylococcus aureus, Salmonella, além dos coliformes e outros. Porém,
com a capacitação dos pequenos produtores e uso de uma gestão de boas práticas
de fabricação e pasteurização do leite, a qualidade microbiológica do queijo de
coalho melhorou substancialmente, tornando-se próprio para o consumo humano.
Por outro lado, a pesquisadora Jéssica de
Aragão Freire Ferreira, em sua dissertação de mestrado na Escola de Saúde
Pública da USP, enfatizou que “um alimento seguro ou inócuo é aquele livre ou
que contenha níveis aceitáveis de contaminantes de origem biológica, química ou
física, sendo, portanto, incapaz de oferecer riscos ou danos à saúde do
consumidor”.
Dados do Ministério da Saúde no período de 2000 a 2015, que
tratavam de Doenças Transmitidas por Alimentos (DTA) foram analisados no seu
trabalho. Segundo a autora, dados da Organização Mundial de Saúde mostram que
mais de um terço da população mundial, incluindo os países desenvolvidos, “é
acometida por surtos de DTA anualmente, embora a maioria dos casos não seja
notificada às autoridades sanitárias locais”.
Os surtos de DTA resultaram em mais de duzentos
mil doentes e 67 óbitos. Para a autora, o principal local de ocorrência dos surtos
de DTA são as residências, “seguidas pelos restaurantes/padarias, creches e
escolas, sendo a bactéria Salmonella a mais presente, principalmente em
produtos derivado de ovos.
A pesquisa critica a subnotificação de casos no
Brasil e faz um apelo para o desenvolvimento de medidas políticas, educativas,
legislativas e de pesquisa, voltadas para o controle de surtos de origem
alimentar. Assim, no Brasil informações sobre doenças e mortes causadas por
alimentos são limitadas.
Felizmente, com os avanços da ciência da
nutrição e de outras especialidades tais como a ciência e tecnologia de
alimentos, gestão de alimentos e outras, é possível se ter uma alimentação
saudável e de níveis nutricionais adequados, tornando os alimentos uma espécie
de medicina para a cura de muitas doenças.
Com uma liderança governamental
junto ao setor privado é possível promover um melhor bem-estar e baixar os
custos de cuidados de saúde. O governo tem que começar a taxar de forma elevada
todos os sucos e bebidas açucarados, bem como uma série de alimentos nocivos e
ofensivos à saúde e subsidiar as empresas que produzem alimentos de proteção à
saúde.
Isto já é praticado contra as indústrias de tabaco e bebidas alcoólicas.
Além disto, os níveis de aditivos ofensivos à saúde tais como sódio, açúcar e
gorduras trans podem ser reduzidos através de decisões voluntárias das
indústrias ou de regulação de padrões de segurança dos alimentos.
Assim sendo, precisamos mudar dos alimentos que
matam para os alimentos que curam. Recente texto no site Eco-Debate não só
tratou dos agrotóxicos e da “comida que nos matam” como ofereceu uma extensa
literatura sobre o tema. Com o surpreende aumento de uso de agrotóxicos no
Brasil, o discurso de sustentabilidade da agricultura
brasileira não é só falso, como afeta a agroindústria e vários setores da
cadeia de suprimento de alimentos.
A sociedade brasileira está numa encruzilhada e
deve rapidamente fazer exigências dos órgãos governamentais e do setor
agrícola. Precisamos de mudanças rápidas de mentalidade que requerem uma
intervenção alimentar nas escolas e em casa e na venda de produtos ofensivos, como
parte do trabalho de uma nutrição adequada, que venha fortalecer a confiança
nos alimentos.
Hoje, infelizmente, a mão que nos alimenta nos põe em risco alarmante.
Estamos vendo os custos sociais e econômicos, além de outras sequelas, do COVID-19, mas vamos nos amedrontar
com o envenenamento de uma sociedade.
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