Dos Médicos de Pés Descalços à Batalha da IA China-USA

 

Fonte: You Tube

Há décadas, quando o mundo ocidental já disponha de sofisticadas tecnologias para melhoria das condições de saúde de sua população, na China um grande contingente populacional, principalmente na zona rural, alcançou estas melhorias com os chamados médicos de pés descalços. Hoje, na batalha da Inteligência Artificial (IA) China-USA, observa-se a superioridade chinesa.

Na semana passada, a imprensa mundial mostrou que o avanço chocante da empresa chinesa denominada de Deep-Seek ameaçou a aura de invencibilidade da indústria de tecnologia americana, levando as ações das high-techs americanas despencarem no mercado. Só a fabricante de chips de Inteligência Artificial Nvidia perdeu quase US$ 600 bilhões em valor de mercado.

É preciso que a sociedade entenda que toda tecnologia tem embutida nela uma força política, ou seja, tecnologia é política. Assim sendo, a IA (Inteligência Artificial) não é apenas um fenômeno tecnológico, mas coproduzida na interseção do social e técnico, levando-nos a uma análise crítica das definições tecnológicas em busca de definições sociopolíticas.

Já foi dito que hoje, mais do que nunca, precisamos avançar numa teoria social crítica da IA, que está aí com o poder de se apresentar como “o Futuro”, esquecendo que existem muitos futuros possíveis, com ou sem tecnologia. Precisamos de um futuro melhor, mas a IA está longe de nos oferecê-lo.

Precisamos mostrar o quanto a IA é direcionada pelas ideologias. Isto significa que certas ideias, conectadas às relações de poder na sociedade, são construídas como verdades e objetivos oferecidos pela IA mesmo sabendo-se que muitas outras verdades e objetivos podem ser possíveis fora da IA. Com isto é de fundamental importância considerar a governança e governabilidade dos países desenvolvedores de IA.

A IA é, como outras mídias, portadora de ideologias, sendo que a IA desempenha um papel significativo na promoção e formação de ideias sobre o que é considerado verdadeiro, importante e priorizado na sociedade. Em resumo, as ideologias moldam a IA e a IA molda as nossas ideologias.

No momento estamos percebendo como, no mundo capitalista, bilionários de ideologias de extrema direita, nos Estados Unidos, defendem a avareza e intensificam as desigualdades sociais, ameaçando práticas democráticas e direitos humanos, ao expulsar refugiados algemados e acorrentados. Nada contra a expulsão de imigrantes criminosos, mas aqueles que viveram servindo a sociedade americana devem ser tratados diferentemente.

A política de tarifas contra aliados, que mais parece um processo de chantagem, pode levar alguns países a se sentirem ofendidos nas relações comerciais. No momento, as big techs americanas, vem ameaçando o mundo com fake News, sendo a liberdade de expressão definida por magnatas americanos como Mark Zuckerberg e Elon Musk.

Assim sendo, tanto no campo das mídias sociais como no campo da IA, a literatura da teoria social crítica existente é rica em oferecer possibilidades de se analisar como as tecnologias existentes são carentes de transparência e ética em seu uso, intensificando a exclusão, discriminação e opressão.

Na ideologia chinesa não se pode esquecer, também, as questões inerentes à democracia e governança, quando vem a nossa mente o sangrento massacre da Praça da Paz Celestial e as práticas do trabalho escravo dos povos Uyghurs. Outras etnias vivem sob condições de trabalho opressor em Xinjiang, área remota da China ocidental, onde estão sujeitos à detenção em massa e torturas pelo governo chinês, segundo a imprensa.

A exemplo de vários outros países, o Brasil já foi vítima do uso de tecnologias de informação onerosas, a exemplo dos sistemas de informação, adquiridos de países desenvolvidos, quando a ênfase era dada meramente as capacidades técnicas destas tecnologias, omitindo-se as implicações sociais e políticas.

Diante da amplitude da IA abrangendo áreas como serviços de saúde, educação, justiça criminal, processo decisório, políticas públicas e  várias outros, temos que nos preocupar com os riscos de concentração de poder e falta de transparência. Neste caso, só através de uma análise crítica da IA é possível nos afastarmos das definições tecnológicas em direção à visão sociopolítica.  

A verdade é que o mundo não está preparado para usar a IA e não deve embarcar nos interesses das grandes corporações. Depois da criação da bomba atômica, o mundo tem feito um longo e grande esforço em não usá-la. Diante dos riscos da IA, um longo tempo é também necessário para avaliar sua utilidade para a humanidade.

Por fim, as bases da teoria social crítica nos levarão, com certeza, a fazer a melhor escolha entre a IA dos Estados Unidos e da China. O mercado pode ter feito uma análise da tecnologia, mas as implicações sociais e políticas da IA ainda são carentes de análise.

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